segunda-feira, 10 de maio de 2010

Sermão do Mandato




O primeiro remédio que diziámos, é o tempo. Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. Atreve-se o tempo a colunas de mármore, quanto mais a corações de cera? São as afeiçoes como as vidas, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito. São as linhas, que partem do centro para a circunferência, que quanto mais continuadas, tanto menos unidas. Por isso os Antigos sabiamente pintaram o amor menino; por que não amor tão robusto que chegue a ser velho. De todos os instrumentos com que o armou a natureza, o desarma o tempo. Afrouxa-lhe o arco, com que já nao atira; embotalhe as setas, com que já nao fere; abre-lhes os olhos, com que vê o que nao via. e faz-lhe crescer as asas, com que voa e foge. A razão natural de toda esta diferença, é por que o tempo tira a novidade das coisas, descobre-lhes os defeitos, enfastia-lhes o gosto, e bastam que sejam usadas para que não sejam mais as mesmas. Gasta-se o ferro com o uso, quanto mais o amor? O mesmo amar é causa de não amar, e o ter amado muito, de amar menos.

(Padre Antonio Vieira)

Nenhum comentário:

Postar um comentário